Cronotacógrafo: a caixa preta que não querem abrir

Fonte: Estradas.com.br Desde 1988 o cronotacógrafo faz parte dos itens obrigatórios de veículos de transporte de carga e passageiros. Essa caixa preta do setor de transportes rodoviário pode ...
Fonte: Estradas.com.br

cronotacografo
Desde 1988 o cronotacógrafo faz parte dos itens obrigatórios de veículos de transporte de carga e passageiros. Essa caixa preta do setor de transportes rodoviário pode contribuir de forma definitiva para reduzir acidentes, além evitar a exploração dos motoristas profissionais, já que fornece informações essenciais para a segurança rodoviária como a velocidade praticada pelo veículo ao longo da viagem e a carga de trabalho do motorista. Embora seja de interesse da sociedade a utilização das informações que o equipamento fornece, sempre existiram, e ainda estão presentes, forças ocultas que não querem deixar abrir esta caixa preta. Agora, graças ao Inmetro, a situação poderá mudar. 

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O chamado cronotacógrafo é um equipamento que registra tempo de viagem, distância percorrida e velocidade praticada. É obrigatório para veículos com mais de 10 passageiros e de carga em geral.  As informações ficam registradas num pequeno disco com papel especial, conhecido como disco diagrama.

As ações de bastidores, na esfera política e administrativa,  fizeram com que esse equipamento obrigatório, usado como instrumento de prevenção para evitar acidentes de trânsito na Europa, fosse praticamente ignorado pelos agentes de trânsito no nosso país. O lobby está presente em vários órgãos responsáveis pelo transporte de passageiros e fiscalização, onde a influência de maus empresários ainda é mais forte que o interesse público.

A principal razão foi a falta de apoio na hora de punir o infrator. Durante o lançamento da Frente Parlamentar para o Trânsito Seguro, ocorrido em Brasília no mês passado, a Diretora Geral da Polícia Rodoviária Federal, Maria Alice Nascimento Souza, enfatizou esse ponto, quando lamentou que o patrulheiro ao verificar que um motorista dirige número excessivo de horas, não pode puni-lo por falta de amparo legal, já que não existe lei que estabeleça limite de tempo de direção contínua.

Da mesma forma, um agente de trânsito, até bem pouco tempo, verificando que um motorista de ônibus estava dirigindo numa rodovia em excesso de velocidade por horas, não tinha os instrumentos legais para aplicar multa por condução perigosa ou até mesmo excesso de velocidade. 

Esse é outro ponto crucial que empresas e até autônomos querem evitar. O equipamento é um registrador instantâneo de velocidade, portanto, o excesso de velocidade é facilmente identificável. Caso as autoridades de trânsito e responsáveis pelas linhas de ônibus, decidam usar o tacógrafo para comprovar o excesso de velocidade, tornariam praticamente impossível os abusos, particularmente no frete rodoviário e transporte de passageiros de linhas regulares.
No caso de ações trabalhistas, o excesso de jornada também poderá ser comprovado com facilidade. Sem contar a responsabilidade de embarcadores que praticamente obrigam motoristas a fazerem viagens em alta velocidade e quase sem descanso para entregar a mercadoria o mais rápido possível. Não importando que colocam em risco a vida de outras pessoas.

Primeira mudanças – Em maio de 1999 a Resolução do Contran 92/99 estabeleceu os critérios técnicos mínimos do registrador instantâneo e inalterável de velocidade e tempo (cronotacógrafo). Dizia no seu Art. 7o. “O registrador instantâneo e inalterável de velocidade e tempo e o disco ou fita diagrama  para a  aprovação pelo órgão máximo executivo de trânsito da União, deverá ser certificado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial –INMETRO, ou por entidades por ele credenciadas. “   

O que parecia uma tarefa simples, dependia da criação de uma rede de centros credenciados, por todo país, onde pudesse ser verificado o equipamento e depois do teste de ensaio, dentro dos padrões estabelecidos pelo órgão competente, no caso Inmetro, o mesmo fosse selado, para garantir a confiabilidade das informações registradas no disco diagrama.  

Da publicação da Resolução 92/99 até o início desse trabalho foram percorridos praticamente 10 anos. Nesse período, transportadores e embarcadores irresponsáveis, desfrutaram da mais completa impunidade, salvo os casos de acidentes de trânsito, principalmente com vítimas, onde o judiciário sempre aceitou laudos periciais baseados nas informações geradas pelo cronotacógrafo.

Consultamos o Inmetro sobre o trabalho que está sendo realizado e também outros órgãos interessados nos benefícios gerados pelas informações produzidas pela caixa preta do setor de transportes rodoviários.  Na sequência você pode ler várias entrevistas sobre a importância do trabalho do Inmetro, que está criando as condições necessárias para efetivamente reduzirmos acidentes e a exploração de motoristas profissionais.

Entrevista do INMETRO – O órgão designou o Dr. Jorge Seewald, diretor de Programas e Inovação (DIPIN) da Superintendência do Inmetro no Rio Grande do Sul para prestar alguns esclarecimentos. Veja a entrevista:

– Estamos num momento em que se fala muito da importância da Caixa Preta dos aviões, devido ao acidente da Air France. Qual a importância do trabalho que o Inmetro está realizando, com a certificação do cronotacógrafo, a caixa preta do setor de transportes rodoviários? Efetivamente, o cronotacógrafo instalado nos veículos enquadrados no artigo 105 do CTB guarda semelhança com as “caixas pretas” utilizadas pelos aviões, na medida em que esse instrumento registra continuamente e de forma inalterável as velocidades desenvolvidas, as distâncias percorridas e o tempo de condução do veículo. Estes registros poderão ser utilizados tanto pelas autoridades de trânsito para coibir excessos de velocidade e tempo de direção como pelos peritos na elucidação das causas de acidentes graves. Em ambos os casos o instrumento estará ajudando a diminuir acidentes – a partir do conhecimento da existência e da validade destes registros, deverão se redobrados os cuidados na condução e na administração destas frotas.

– Considerando que a rede do Inmetro já tem mais de 800 pontos de selagem no Brasil, como foi montar em tão pouco tempo esta estrutura? Atualmente já estão operando (ou prestes a operar) 110 Postos de Ensaio e, nos próximos três meses totalizaremos 143. Todos equipados com banco de rolos necessários para os ensaios desta verificação. Além disso, o Inmetro cadastrou mais de 800 oficinas, na qualidade de Postos de Selagem, para realizar a selagem e ensaios preliminares realizados em bancada que permite a emissão de certificados provisórios com validade de três meses, período no qual o veículo deverá ser levado ao Posto de Ensaio para ensaio em banco de rolos. 
A implantação deste grande estrutura partiu de uma ideia bastante simples e nem sempre lembrada. O Inmetro buscou aproveitar toda a infra-estrutura já existente formada por oficinas que atuavam exclusivamente na manutenção e reparo destes instrumentos. A partir deste grupo que já conhecia amplamente o mercado de cronotacógrafos no país, passamos a ouvir e atender as necessidades dos interessados, representados por empresas ou associações e autônomos que atuam na área de transporte. 

Definida a metodologia através de edital, mantivemos contato permanente com todos os interessados, tanto diretamente como através de um site criado especialmente para este programa. Além disso, adequamos constantemente a metodologia prevista às necessidades identificadas e às possibilidades da administração pública. 

O respeito e atendimento às necessidades dos interessados, demonstrados pela flexibilidade do programa, estabeleceu um processo aberto e com a credibilidade necessária para a incorporação de novos agentes decisivos para o sucesso do programa. Esta sinergia permitiu atender aos preceitos da administração pública sem comprometer os da iniciativa privada a partir da confiança estabelecida entre as partes. 

Em nosso entendimento, foi esta confiança que pavimentou o caminho para o rápido desenvolvimento de tamanha estrutura em tão pouco tempo, o que demonstrou, ainda, em nosso entendimento, ser possível o enfrentamento de problemas de dimensões continentais como as do Brasil. Isso desde que se estabeleçam soluções criativas que respeite as necessidades dos interessados a partir do exercício do permanente discernimento e flexibilidade nas decisões adotadas para soluções dos problemas ao longo do processo de implantação dos programas. 

– A Presidente Dilma afirmou recentemente que é prioridade para o Governo Federal a redução de acidentes de trânsito. O Inmetro pretende levar essa experiência com os cronotacógrafos para os ministérios da Justiça, Saúde, Trabalho e Transportes, já que as informações geradas pelo equipamento são essenciais para o trabalho de prevenção de acidentes? Ao Inmetro compete atender a verificação metrológica dos cronotacógrafos para que seus registros sejam confiáveis e possam produzir provas aceitas judicialmente. Este trabalho deverá estar finalizado até o final deste ano. A partir de então as demais esferas de governo poderão contar com este importante instrumento de produção de provas que podem ser úteis nos âmbitos destes ministérios. Ciente de sua responsabilidade, o Inmetro desenvolveu e implementou este programa ,que permitirá a adoção de programas de controle de interesse da sociedade, objetivo da presidente da República.

– Com a certificação as autoridades de trânsito podem estar certas de que a informação gerada no disco diagrama corresponde a realidade? O atendimento à verificação metrológica, com a emissão do respectivo certificado, garante o atendimento à legislação vigente. Entretanto, é somente com a correta utilização do cronotacógrafo, a preservação das marcas de selagem e das características gerais do instrumento e adequada condução do veículo que permitirão – não somente melhor controle da frota como, em caso de acidente – a produção de prova aceita judicialmente em favor do condutor e do proprietário. O não atendimento à verificação do Inmetro permite o pressuposto da não correção dos registros e, especialmente nos casos acidentes com vítimas, impede a produção de provas e evidencia objetivamente o não cumprimento de exigência prevista em Lei.