Brasileiro começa a trocar o avião pelo ônibus

Fonte: O GloboTexto: Marcelo CorrêaFoto: Thiago Martins de Souza Diante da necessidade de economizar, o brasileiro volta a incluir o ônibus em seus planos de viagem. Com o orçamento apertado, a ...
Fonte: O Globo
Texto: Marcelo Corrêa
Foto: Thiago Martins de Souza


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Diante da necessidade de economizar, o brasileiro volta a incluir o ônibus em seus planos de viagem. Com o orçamento apertado, a rodoviária ganha espaço, principalmente, para quem viaja com frequência. Um levantamento do Ministério do Turismo e da Fundação Getulio Vargas mostra que 14% dos entrevistados pretendem usar o transporte rodoviário nos próximos seis meses. Trata-se do maior percentual para o mês desde 2005, quando a pesquisa começou a ser divulgada. Segundo especialistas, o pano de fundo da mudança de rota inclui a queda na renda e a alta do dólar.

A preferência pela viagem de avião recuou de 58,3% em setembro de 2014 para 51,8% no mês passado. Nos últimos anos, com os ganhos de renda conquistados antes de a crise reduzir o poder de compra do brasileiro, o número de “marinheiros de primeira viagem” era de tal ordem que as agências de turismo passaram a publicar guias para quem começava a se familiarizar com a rotina dos aeroportos. A pesquisa do Ministério do Turismo mostra essa trajetória. Entre 2005 e 2010, nas sondagens realizadas em setembro, a intenção de viajar de ônibus caiu constantemente, até chegar a 8%. Agora, a tendência começa a se inverter. A alta do dólar afeta diretamente o custo do querosene de aviação, o combustível usado pelas aéreas.
— É como carne de segunda e carne de primeira. Quando aumenta a renda, aumenta o consumo de carne de primeira. E quando diminui, acontece o contrário — compara o consultor Adalberto Feliciano, professor licenciado de Economia do Transporte Aéreo da Universidade Anhembi Morumbi.
Mesmo assim, Feliciano avalia que a retomada das viagens de ônibus será apenas parcial:
 
— Se o ônibus perdeu 50% dos passageiros para o avião, não vai ganhar esses 50% de volta.
 
TROCA GRADUAL
 
Entre viajantes frequentes, há quem comece gradualmente a substituir o transporte aéreo pelo rodoviário. É o caso do produtor Vitor Aiello, usuário da ponte aérea Rio-São Paulo. Anteontem, ele embarcava para fazer o trajeto pelas estradas, pela primeira vez:
 
— Tive de fazer essa viagem em cima da hora. Antes, conseguia preços melhores, mesmo com pouca antecedência. Agora, fui pesquisar, e a passagem estava R$ 500 só a ida. Preferi pagar R$ 90 na passagem de ônibus.
A biomédica carioca Julia Lemos sente na pele a alta de preços. Com um namorado mineiro, viaja ao menos uma vez por mês para Belo Horizonte. Até o início do ano, fazia o trajeto de avião — desde que a passagem saísse por menos de R$ 200, o que tem sido cada vez mais difícil:
— Nas últimas vezes que meu namorado veio para cá, veio de ônibus. Na semana passada, ele encontrou passagem de ida e volta de avião por mais de R$ 900. Optamos pelo ônibus.

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Para as viagens de férias, a pesquisa do Ministério do Turismo mostra ainda outra tendência que beneficia o transporte rodoviário: a preferência por destinos domésticos. Também na esteira do dólar alto, as rotas internacionais têm sido deixadas de lado. Em setembro, 77,6% dos entrevistados para o estudo responderam que pretendem fazer viagens pelo Brasil, contra 76,4% calculados em setembro de 2014. Viagens para o exterior eram preferência de 18,7%, contra 20,4% no mesmo mês do ano passado.
 
José Francisco Salles Lopes, diretor de Departamento de Estudos e Pesquisas do Ministério do Turismo, acrescenta que as rotas mais próximas ganham espaço, quando o consumidor tem menos para gastar.
 
— Se a pessoa está pretendendo sair de Juiz de Fora e passar uma temporada no Rio, o ônibus é a opção natural — avalia.
 
O aumento da preferência pelo ônibus, no entanto, não impediu o setor de amargar um mau momento. Segundo dados da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), o número de passageiros pagantes em ônibus interestaduais recuou 5,16%, para 23 milhões de pessoas.
 
As empresas confirmam a fase ruim. Segundo Carolina Esteves, gerente de marketing da Util, a tendência é que a alta do diesel afete a margem de lucro, já que o mercado é regulado, e não é possível reajustar preços até julho. A migração do meio aéreo para o rodoviário traz esperança ao setor.
 
— Existe uma estimativa de aumento da demanda por uma migração dos passageiros do aéreo que, nos próximos meses, possivelmente, passarão a usar as empresas rodoviárias. Esse cenário é muito recente, e ainda não estamos sentindo um impacto significativo, mas esperamos aumento de 10% nos próximos meses — disse a executiva, em entrevista por e-mail.
 
Nos terminais de São Paulo, a crise também foi sentida. Segundo a Socicam, empresa que administra as rodoviárias da cidade, o movimento nos três terminais paulistas (Tietê, Barra Funda e Jabaquara) recuou 1,1% entre janeiro e setembro, na comparação com o mesmo período do ano passado, ficando em 13,3 milhões de passageiros. Para os feriados de Natal e Ano Novo, a expectativa é de estabilidade.
 
No Rio, a rodoviária Novo Rio também sentiu a queda de passageiros, e diz que busca atrair clientes com novas instalações. “Nos últimos 5 meses, registramos, inclusive, uma queda de aproximadamente 8% no embarque de passageiros pela Novo Rio, em reflexo da crise econômica”, afirmou a concessionária, em nota.
 
ALTA NO FERIADÃO
 
Em nota, a viação 1001 admitiu o momento ruim para o setor, mas destacou que busca competir com outros meios de transporte. “O transporte rodoviário de passageiros também foi afetado pela crise, com retração da demanda e aumento dos custos”.
 
Para Cesário Martins, sócio da ClickBus, plataforma de vendas de passagens rodoviárias on-line, o cenário é parecido com o que o setor viveu em 2013, com a alta do dólar — na época, em outro patamar. A empresa é parceira de 60 companhias de ônibus e tem 1 milhão de usuários frequentes:
 
— Em 2013, quando o dólar subiu a R$ 2,28, valor alto para a época, a gente viu esse movimento. Para o feriado de 12 de outubro, tivemos alta de 10% nas vendas em relação ao último feriado prolongado, de 7 de setembro. Para o fim do ano, a expectativa é de alta de 150% em relação ao ano passado.

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