Petrobrás espalha prejuízos e desilusão; Empresas de ônibus amargam perdas

Fonte: EstadãoTexto: Alexa SalomãoFotos: Alex Silva / Diego Almeida Araújo Os relatos de empresários em Pernambuco, dos mais diversos setores, repetem a mesma história. Há mais de uma década, o ...

Fonte: Estadão
Texto: Alexa Salomão
Fotos: Alex Silva / Diego Almeida Araújo

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Os relatos de empresários em Pernambuco, dos mais diversos setores, repetem a mesma história. Há mais de uma década, o pessoal da Petrobrás desembarcou por lá, anunciando o renascimento, em grande estilo, da cadeia de petróleo e gás no Brasil. O Nordeste seria um protagonista. O Porto de Suape, a 40 quilômetros da capital, Recife, receberia estaleiros, como o Atlântico Sul, e a refinaria Abreu e Lima, a primeira de uma sequência que ainda incluía a Premium I, no Maranhão, e a Premium II, no Ceará. Quem estivesse interessado em participar da nova fase, ingressando na cadeia de fornecedores, deveria se qualificar para todos esses negócios, pois a proximidade regional faria deles candidatos naturais para trabalhar na construção e, depois, no apoio aos serviços operacionais. A euforia foi grande – e o tombo após as denúncias da Lava Jato, no ano passado, maior ainda.

A Abreu e Lima foi arrastada por denúncias de corrupção e sobrepreço. O Atlântico Sul, por sua vez, sem receber, rompeu um contrato bilionário com a Sete Brasil, empresa criada pela Petrobrás para gerenciar compras de sondas. O efeito dominó foi inevitável. “Quando a Lava Jato parou a Petrobrás, o impacto sobre nossas pequenas e médias empresas foi muito forte”, diz o secretário de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco, Tiago Norões. “Ao menos, a Abreu Lima foi construída, o que não vai ocorrer com as demais refinarias: entre mortos e feridos, só saímos feridos.”

Os ferimentos, porém, foram profundos. As empresas locais eram terceirizadas e até quarteirizadas da Petrobrás. Firmaram contratos com os consórcios formados por grandes construtoras, as mesmas investigadas por corrupção. Alusa, Engevix, Jaraguá são exemplos de empresas que tiveram e causaram problemas em Pernambuco. Sem receber das construtoras, as locais penaram. Locadoras de automóveis, de aluguéis de guincho, de material de segurança e de limpeza, empresas de alojamento, de guindastes, de alimentação, pousadas que hospedavam funcionários – tudo o que gravitava nas obras com a bandeira Petrobrás sentiu o tranco.

Como os negócios são pequenos e pulverizados, ninguém conseguiu calcular o rombo. Quem participa de reuniões para desatar o nó criado, porém, estima que o estrago seja grande. “Não sabemos o total do prejuízo porque nós não conseguimos nos unir para chorar as mágoas juntos, mas se você olhar uma lista com participantes de uma reunião vai ver mais de 200 empresas – há todo um leque de terceirizados e quarteirizados sem receber”, diz Joselito Pereira da Silva, diretor executivo na TBS, empresa de fretamento de ônibus com sede na Paraíba que ainda tenta receber os R$ 5,5 milhões que lhe devem. “Por tudo que tenho ouvido nesses encontros, a conta deve passar de R$ 500 milhões.” Pereira lamenta que a crise que se vê na Petrobrás tenha arranhado qualidades da empresa antes inquestionáveis, como a gestão: “Enquanto todas as empresas de petróleo do mundo ganhavam dinheiro, a nossa conseguiu perder – o que é isso se não um problema sério de gestão?”, questiona.

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No setor de fretamento, além das dívidas, as empresas não sabem o que fazer com os ônibus comprados. Uma das maiores, a My Bus, tem cerca de R$ 12 milhões a receber e está com 120 carros parados no pátio por falta de contrato. “Em 10 anos de empresa, nunca vi uma coisa tão triste”, diz Samuel Sebastião da Silva, encarregado de manutenção da My Bus. Todos os dias, ele liga os ônibus e dá umas voltas para o motor não estragar.

Sem garantia. O mais traumático no processo foi ver a potência verde e amarela perder credibilidade. “Produzir para a Petrobrás não é mais garantia de recebimento: essa foi a grande mudança que ninguém esperava. O contrato hoje não vale: o consórcio não recebe dela, não nos paga, nós não pagamos alguém e esse alguém deixa de produzir, demite ou até fecha”, diz Glaidson Camacho coordenador da MKS. Pesa também o fato de a falta de credibilidade ter abalado também a relação com quem tem o dinheiro: os bancos. “Se você diz que é Petrobrás, coisas muitos simples, como o desconto de fatura, fica difícil”, diz Paulo Rebouças, um dos sócios da MKS. “Hoje a gente vê fornecedores nossos, de alimentação, gente pequenininha, que têm problemas para conseguir até capital
giro.”

A MKS, com sede na Bahia, produz sistema de tubulações com ligas sofisticadas. A unidade em Pernambuco atenderia a nova fase de expansão anunciada pela Petrobrás. O planejamento de longo prazo, porém foi para espaço. A MKS não recebeu tudo que lhe deviam e teve R$ 2 milhões de prejuízo no ano passado. Para evitar perdas maiores, aceitou até escambo. “Recebemos da OAS e da Odebrecht máquinas no lugar de pagamento – foi um bom negócio para os dois lados”, diz Rebouças.

Na lista dos prejudicados, os setores metal­mecânico e o de fretamento de ônibus são os mais organizados. O primeiro estima que precisa receber R$ 50 milhões, o segundo, por volta de R$ 35 milhões. Somando, são uns R$ 85 milhões. Os valores, considerados diminutos frente a potência financeira da maior estatal brasileira e das construtoras, irritam quem praticamente fechou as portas. “Menos da metade da propina de um simples gerente da Petrobrás resolveria os problemas financeiros de dois setores aqui em Pernambuco”, diz o empresário Eduardo Cunha, da Plain. Cunha se refere ao ex-­gerente da Petrobrás, Pedro Barusco, que declarou ter acumulado em propinas cerca de US$ 70 milhões (R$ 210 milhões).

Cunha lembra quando, por volta de 2006, os representantes da Petrobrás começaram a chegar e fizeram um “chamamento” aos empresários locais. “Promoviam recepções. Falavam em números estratosféricos. Diziam que qualquer coisa que a gente pudesse imaginar seria maior ainda. Todo mundo saiu comprando equipamentos, investindo, ampliando”, lembra. Para dar uma dimensão do que veio a seguir, na época, o galpão de sua empresa tinha 2, 5 mil metros quadrados. Hoje tem 8 mil.

Cunha entrou na Abreu e Lima ainda na terraplanagem. Atendeu os maiores consórcios. Os negócios iam bem até que os atrasos no pagamento começaram na virada de 2013 para 2014. “Foi quando a Petrobrás nos chamou, junto com o consórcio que eu prestava serviço, lá dentro da Abreu e Lima, o EBE­Alusa: fizeram uma reunião, não só comigo, mas com todos os fornecedores do consórcio, para pedir um apoio, que a gente não se preocupasse”, conta. O trabalho foi retomado, mas apenas dois pagamentos forram feitos, um em julho e outro em setembro. Quando chegou outubro, tudo parou. “Ninguém falou mais nada, ninguém deu satisfação, e o consórcio foi expulso da refinaria – expulso de verdade, o pessoal foi proibido de entrar.” Cunha só conseguiu uma posição depois do Carnaval de 2015. “A Petrobrás não pode comprar o material diretamente e fará um nova licitação: vou jogar tudo isso no lixo”, diz.

Há 140 tonelada de estruturas empilhadas no pátio, numa área em que começava a fazer uma nova expansão. Quando foram produzidas, valiam R$ 13 o quilo. Uma parte, conseguiu vender como sucata a R$ 0,20 o quilo. A Plain tem a receber R$ 3,5 milhões – R$ 1,7 milhão de material entregue e R$ 1,8 milhão de encomendas. O rombo foi fatal. Dos 280 funcionários, restam 10. Procurada, a Petrobrás não respondeu até o fechamento desta edição. 


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