Terminais rodoviários de João Pessoa não têm placas em braille

Fonte: G1 Paraíba Fotos: Divulgação / André Resende Edilson dos Santos, 53 anos, tem deficiência visual. Diariamente ele precisa do transporte público para se locomover entre sua casa, no bairro do ...
Fonte:
G1 Paraíba

Fotos: Divulgação / André Resende

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Edilson dos Santos, 53 anos, tem deficiência
visual. Diariamente ele precisa do transporte público para se locomover entre
sua casa, no bairro do Rangel, até outras partes de João Pessoa. Esquivando degraus e calçadas
com desníveis para chegar até o Terminal de Integração do Varadouro nesta
sexta-feira (28), Edilson precisou contar com a ajuda de uma outra pessoa para
saber se o ônibus que esperava passava no ponto em que estava.

Desempregado há dois anos, desde quando adquiriu a
deficiência após um Acidente Vascular Cerebral (AVC) e um descolamento de retina,
Edílson dos Santos e outros deficientes visuais que moram em João Pessoa não
precisariam depender da ajuda de outras pessoas se a lei 10.297, aprovada em
maio de 2014, tivesse sido implementada e devidamente cumprida. A norma, criada
pelo deputado Ivaldo Moraes (PMDB), prevê a instalação de placas em braille nos
terminais rodoviários urbanos e interurbanos com informações sobre linhas de
ônibus e itinerários.
 
O desrespeito à lei por parte dos órgãos públicos
motivou uma notificação do Ministério Público. Após denúncia do G1, o promotor
do cidadão de João Pessoa, Victor Granadeiro, requisitou nesta sexta-feira (28)
esclarecimentos junto a Superintendência de Mobilidade Urbana de João Pessoa
(Semob) e do Departamento de Estradas e Rodagem da Paraíba (DER). Segundo o
promotor, é preciso conhecer as razões pelas quais as placas ainda não foram
instaladas.
 
“Primeiro instalei um procedimento cobrando uma
resposta com relação a implementação da lei. Dependendo das respostas, isso
pode se transformar em uma reunião com os órgãos e, em um último caso, em uma
ação civil pública. A nossa intenção é que isso seja resolvido com a boa
vontade do executivo”, comentou.

edilson dos santos
O representante do Ministério Público ressaltou
ainda que em alguns casos as leis não prevêem critérios para que seja colocada
em prática, deixando lacunas que acabam não obrigando o poder executivo, seja
estadual ou municipal, a implementar a norma. “Quase todo mundo pensa que basta
publicar [a lei] que já resolve tudo, resolveria se o Legislativo incluísse
critérios de implementação. Tem muito trabalho que é feito pra mídia e cria uma
lei que joga a carga para o executivo”, concluiu Granadeiro.
 
O presidente do Instituto dos Cegos da Paraíba,
José Antônio Ferreira Freire, reclama que a aplicação efetiva da lei
10.927/2014 é uma cobrança antiga. Representantes do instituto e Associação dos
Cegos da Paraíba buscaram, em junho deste ano, os poderes legislativo e
executivo para cobrar o cumprimento da norma, mas, segundo ele, nada foi feito.
“A nossa intenção é recorrer ao Ministério Público nessa luta, para que haja um
ação que puna o descumprimento da lei”, relatou.

Conforme a fundamentação da lei, as placas deviam ter sido instaladas até o mês
de agosto. Em caso de desobediência, a norma prevê a punição do gestor
responsável pelo terminal com a suspensão do trabalho por 15 dias, com desconto
salarial dos dias não trabalhados e instauração de um processo administrativo.
“Uma ação, qualquer que seja, não é uma coisa boa. Mas caso não haja resposta,
o gestor deve ser penalizado, conforme a letra da lei”, completou o promotor do
cidadão.
A ex-presidenta do Instituto dos Cegos e deficiente
visual, Suzi Belarmino, salienta que as leis voltadas para melhorar a vida das
pessoas com deficiência normalmente têm pouca aplicabilidade prática, pois o
legislador compõe a norma sem consultar os próprios deficientes. “No caso dessa
lei das placas, a princípio, não há uma indicação do local onde será afixada.
Como é que o cego vai conseguir localizar? Vai haver uma sinalização no chão ou
algum funcionário para informar? É necessário que haja um debate com as pessoas
que serão beneficiadas diretamente com a lei para saber se esse benefício será,
de fato, real”.
 
O G1 entrou em contato com a Semob via email para saber
os motivos do descumprimento da lei, mas até a publicação desta reportagem a
resposta não havia sido enviada. A administração do Terminal Rodoviário de João
Pessoa também foi contactada, no caso da lei prever placas em terminais
interurbanos.
 
O gerente do terminal, Reinaldo Brasil, informou
que a lei não regulamenta placas em terminais estaduais, apenas em pontos
municipais. Ela ainda garantiu que ainda assim, a administração da Rodoviária
de João Pessoa pretende instalar placas informativas em braille com linhas e
itinerários. O G1 também tentou o contato com Ivaldo Moraes, criador da lei,
para questionar a falta de critérios mais claros de implementação das placas na
norma, mas as ligações para o gabinete do deputado não foram atendidas.

Em meio a leis que deixam brechas e administrações
públicas que se aproveitam dessas mesmas lacunas para não descumpri-las,
Edilson dos Santos permanece dependendo da ajuda de outras pessoas para
conseguir pegar ônibus, exercer seu direito humano de ir e vir. “Ter que
esperar ajuda é difícil. Às vezes as pessoas são grossas, empurram você, não
respeitam. Mas como não tenho opção, vou me virando com ajuda das outras que
são boas”, conclui Edilson à espera do ônibus, de mais respeito, e de dignidade
para deficientes visuais.