Jornal do Comércio
Juliano Tatsch
imaginar que a quantidade de acidentes de trânsito, de atropelamentos, de
mortes, de pessoas feridas, de dor e de sofrimento irá diminuir somente com
campanhas de conscientização. Também é difícil acreditar que os prejuízos
econômicos e sociais que as intermináveis filas de automóveis em
congestionamentos causam irão acabar somente pedindo-se que as pessoas deixem
seus veículos em casa. O fato é que, com o crescimento que a frota de veículos
nas vias vem tendo, é inevitável que ocorram mais engarrafamentos e, assim,
também é inevitável que o estresse dos motoristas aumente, gerando um
comportamento mais agressivo.
de ser feito, então, é reduzir o número de veículos nas vias. Há um problema,
porém: como fazer isso em um país em que a economia está aquecida e em que as
pessoas estão tendo cada vez mais facilidades para comprar um carro? A resposta
dada por quem estuda o tema é quase unânime: investir em transporte coletivo.
professor do Departamento de Engenharia de Produção e Transportes da Escola de
Engenharia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Luis Antonio
Lindau, há muito o que ser feito na área. “Precisamos melhorar bastante o
transporte coletivo. Muito, muitíssimo”, enfatiza. Lindau não vê a
realização de grandes obras viárias como uma solução para o problema. “Não
tem como resolver fazendo isso. Se hoje dispuséssemos de uma fortuna para investir
em obras, isso não resolveria o problema, pois ele cresce de uma forma muito
maior que nossa capacidade de fazer obras”, destaca.
Lindau, a criação de vias de uso único dos ônibus, com veículos modernos e
confortáveis, faria, ao contrário do que se pode pensar, com que o custo das
passagens diminuísse. “A tarifa de ônibus aumenta porque o próprio carro a
faz aumentar. Na medida em que as vias estão mais congestionadas, é preciso
mais ônibus para prover o mesmo serviço, pois o ônibus vai e não consegue
voltar no tempo certo. Temos é que tirar o ônibus de qualquer congestionamento.
Precisamos ter faixas só para ônibus, que, aliás são dez vezes mais eficientes
para levar pessoas do que uma faixa de carro”, observa.
sabido que o investimento em redes de transporte coletivo é o que traz mais
retorno para a melhoria do trânsito nas grandes cidades, porque, então, isso
não é feito? Para o superintendente da Associação Nacional de Transportes
Públicos (ANTP), Marcos Bicalho, a resposta é simples. “Falta vontade
política dos gestores. Recursos existem e são gastos em outras coisas. Talvez
porque as classes dirigentes não usem o transporte coletivo. É inegável que a
indústria automobilística é uma cadeia produtiva enorme e que tem interesses
enormes. Ninguém quer que essa corrente se rompa. Ninguém quer ver uma crise em
um setor importante como esse”, afirma.
defende os corredores para ônibus como a melhor alternativa, porém destaca a
dificuldade para que isso seja realizado em grande escala. “Acho que os
corredores são o ovo de Colombo. Mas eles são o conflito. É você tirar o espaço
dos carros para dar espaço aos ônibus, uma decisão extremamente difícil e
politicamente radical. Mais radical do que fazer metrô, porque no metrô você trabalha
em um espaço novo. O corredor não, ele é uma ação revolucionária, subversiva em
relação à ordem vigente”, argumenta.
uso do carro terão de ser tomadas
ponto em que os estudiosos convergem diz respeito a medidas de restrição ao uso
do automóvel. Para ambos, cada um apontando um modo diverso, elas precisam ser
tomadas. “Uma coisa é ter o carro, a posse dele. Outra questão é como
adequar isso ao limitado espaço urbano. Não conseguimos crescer o volume viário
na forma como cresce a frota, então precisamos restringir o uso”, ressalta
Lindau. Para o professor da Ufrgs, os motoristas deveriam pagar uma tarifa pelo
uso da via em horários de pico. “Isso faz com que pessoas que não precisam
estar usando-a naquele momento repensem os seus deslocamentos. Isso existe em
vários lugares: em Londres, em Estocolmo”, exemplifica.
é alternativa sustentável
de 2008 a prefeitura de Porto Alegre apresentou o Plano Diretor Cicloviário
Integrado com a promessa de que os 17,6 quilômetros de ciclovias considerados
prioritários estariam prontos já no ano seguinte. A lei criando o plano foi
sancionada pelo então prefeito José Fogaça no dia 15 de julho de 2009. Até
agora, apenas oito quilômetros de vias exclusivas estão prontas na Capital: 4,8
quilômetros no bairro Restinga, dois na avenida Diário de Notícias e 1,2 em
Ipanema.
cidade que se vangloria em ser uma das mais avançadas do País, a existência de
somente oito quilômetros de ciclovias, enquanto no Rio de Janeiro existem 160,
chega a ser vergonhoso. “Hoje as cidades desenvolvidas estão todas
voltadas para isso. Dizemo-nos uma cidade avançada, mas não temos nenhuma
medida na área de transportes que evidencie isso”, afirma o professor
Lindau.
Segundo Kalil, além de um local apropriado, está faltando respeito dos
condutores. “A maioria dos motoristas respeita, mas 10% não, o que é
bastante. O que falta é educação e respeitar o limite de afastamento de um
metro e meio de distância”, avalia. Ele também relata que muitos
condutores aceleram perto dos ciclistas, querendo intimidá-los. “Ainda
existem pessoas que acham que quem utiliza bicicletas deve andar nas calçadas.
Deveria ser feita uma fiscalização maior em torno disso”, complementa.
para ônibus?
como Curitiba e Porto Alegre estão brigando para garantir verbas federais do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da Mobilidade, que destinará R$ 18
bilhões para 24 grandes cidades do País. As duas metrópoles querem aproveitar a
oportunidade para construírem seus metrôs.
Lindau acredita que os valores poderiam ser investidos de um melhor modo.
“Seria preciso perguntar ao governo federal se vale a pena fazer alguns
quilômetros de metrô ou centenas de quilômetros de redes de ônibus de alta
capacidade”, desafia.
O superintendente da ANTP acredita que os dois sistemas se complementam.
“Tem espaço para metrô e para corredor de ônibus. Nenhuma solução é por si
só ideal. O metrô tem de se integrar com os ônibus. Se não se integrar, ele
está meio morto”, observa.
Para Bicalho, o agravamento da situação é o maior aliado para que ações comecem
a ser realizadas. “A discussão do transporte é como a questão ambiental. A
crise é a aliada. A única esperança é que essa crise se agrave a tal ponto em
que sejamos obrigados a tomar decisões antes de ser tarde demais”,
conclui.